Programa Saúde Itinerante leva atendimento a quem ficou isolado pela enchente dentro da cidade

 

No Taquari, muitos idodos e crianças foram atendidos (Foto: Assessoria Sesacre)

No Taquari, muitos idodos e crianças foram atendidos (Foto: Assessoria Sesacre)

 

Colocar ordem no caos. Com esse lema, o programa Saúde Itinerante vai até as comunidades mais isoladas do Acre levar atendimento médico. Com as vítimas da enchente do Rio Acre não foi diferente. Na sexta-feira, 24, a coordenadora do programa Celene Maia partiu com um médico e uma enfermeira para a Rua Baguari, a última do bairro Taquari, de onde só é possível sair de barco nesse período da alagação. Muitos moradores estão praticamente ilhados, abrigados em casa de parentes e amigos e numa igreja.

A divulgação “boca a boca” deixou o espaço da Escola Djanira Bezerra lotado de adultos, idosos e crianças com todo tipo de queixa: pressão alta, febre, vômito, diarreia e dor de cabeça.  O governo e a prefeitura disponibilizaram um kit de medicamentos, por isso, além do atendimento, as pessoas já saíam medicadas.

Raimunda da Silva, 83, mora sozinha e saiu aliviada porque nem remédio para dor de cabeça ela tinha em casa. “Depois da chegada da polícia aqui no bairro, a vinda de vocês foi a melhor coisa. Tem gente doente aqui que não consegue ir até a cidade porque a passagem de ida e volta sai por quatro reais e a gente não tem como pagar, ainda mais nessa situação”, disse Jusimar Souza, outra moradora que procurou o serviço.

Um momento de emoção marcou o trabalho dos profissionais durante o atendimento, com a chegada de um garoto de dez anos que sentia fortes dores havia cerca de três dias e chorava muito. Num exame rápido, o diagnóstico: apendicite. “Já ganhei o dia. O mais gratificante no atendimento de hoje foi termos atendido essa criança e tê-la encaminhado ao pronto-socorro com a ajuda da Polícia Militar, que o levou de barco até a entrada do bairro, onde o Samu já o aguardava. O estado dele é muito grave e precisava urgente de atendimento”, disse, aliviada, a coordenadora do Saúde Itinerante, Celene Maia.

 Dona Francisca Dantas Maia já passou por várias enchentes e levantou o nível da casa para não ter que abandoná-la. (Foto: Assessoria Sesacre)

Dona Francisca Dantas Maia já passou por várias enchentes e levantou o nível da casa para não ter que abandoná-la. (Foto: Assessoria Sesacre)

Em determinado momento a fila do atendimento se agitou. Era a Defesa Civil chegando com as cestas básicas. Foi uma tarde movimentada para os moradores e abrigados, onde se viu todo tipo de situação – gente que perdeu todos os móveis, avó cuidando de netos porque o filho está preso e a mãe das crianças desempregada, outros que moram há mais de 20 anos no bairro, passaram por outras situações de enchente, mas que não saem de lá por nada… Uma mistura de conformismo, abnegação e esperança.

Mas o que se destacou mesmo foi a solidariedade. O pastor Elias Silva e Silva abriga 14 famílias na igreja, três famílias na casa dele e mais quatro na casa de outra pessoa também da igreja. “Me sinto feliz em estar ajudando. Não tenho muita estrutura, mas consegui alojar todo mundo”, disse.

Um dia antes da chegada do Saúde Itinerante, a polícia foi ao local. Oito policiais do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e mais quatro de outras unidades se revezam no policiamento durante 24 horas em dois quadriciclos e um barco, pois, com o abandono das casas e o corte de luz, os ladrões aproveitam para roubar. “Não é só o policiamento, é o auxílio social também. As pessoas estão sensíveis e se sentiram mais seguras com a nossa presença”, explicou o sargento Peres.

Cerca de 300 pessoas foram atendidas e, como muitas não conseguiram, o programa retornou na última segunda-feira, 27, dessa vez levando dois médicos, e atendeu mais cerca de 400 pessoas.  “Entendeu por que o nosso lema é botar ordem no caos?”, perguntou, sorrindo, a coordenadora do programa. 

No caminho, a teimosia

Francisca Dantas Maia mora na mesma casa no Taquari há 27 anos com o marido e o filho e já viu várias enchentes, mas este ano foi a segunda vez que ela viu a água entrar nas casas, menos na sua, porque, depois da experiência de 1997, ela levantou a casa e hoje se recusa a sair de lá. “Tenho muito dó dos vizinhos que tiveram que deixar seus lares. Não gosto de ir para a casa dos outros. Já ganhei sacolão de comida e água, e a polícia passa direto por aqui. Também tenho placa solar e não fico sem luz”, diz, com a certeza de quem não quer morar em outro lugar.