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Pimentel mobiliza governadores e lança “Carta de Diamantina”

Os governadores de Minas Gerais, Fernando Pimentel, e dos estados do Acre, Mato Grosso, Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe e Rondônia lançaram nesta terça-feira (12) a Carta de Diamantina. Segundo o governo mineiro, o objetivo do documento, assinado durante reunião na cidade de Diamantina, no Território Alto Jequitinhonha, e que será encaminhado à Presidência da República, é demonstrar a união e a urgências dos chefes dos Executivos em torno do encontro de contas entre Estados e governo federal – buscando, assim, recuperar as perdas ocorridas devido a Lei Federal 87/1996, conhecida como Lei Kandir. A lei isenta de impostos estaduais as exportações, o que fez Minas deixar de recolher R$ 135 bilhões, de acordo com o governo.

Pimentel, que mobilizou como anfitrião os demais governadores, defendeu que a União adote imediatamente o encontro de contas proposto. Segundo o chefe do executivo estadual, “esse documento trata basicamente da Lei Kandir. Esse é um processo que está em curso em Brasília. Já temos uma decisão favorável do Supremo Tribunal Federal (STF) aos Estados dizendo que o prazo vai até novembro deste ano para que essa compensação seja regulamentada. Também já existe uma Comissão Mista criada no Congresso Nacional para isso. Mas, até onde sabemos, o governo não fez nenhum movimento objetivo nesta direção”.

“O que nós estamos reivindicando é que esse ressarcimento seja feito na forma de um encontro de contas. Ou seja, todos os Estados têm débitos, têm dívidas com a União, e poderíamos abater dessa dívida do montante dos ressarcimentos que terão que ser feitos. Isso facilitaria tanto para a União quanto para os Estados. A Carta de Diamantina reitera essa reivindicação”, defendeu.

A declaração ocorreu em coletiva após o encontro, que reuniu os governadores Tião Viana (Acre), Pedro Taques (Mato Grosso), Wellington Dias (Piauí), Robinson Faria (Rio Grande do Norte), Confúcio Moura (Rondônia) e Jackson Lima (Sergipe).

A Carta de Diamantina lembra que a Lei Kandir, ao isentar o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) das exportações de produtos primários e commodities, estabeleceu ressarcimentos aos Estados pelas perdas inerentes à isenção. Esses ressarcimentos, portanto, justificam a necessidade de reparar prejuízos ocorridos devido à ausência de arrecadação de tributos estaduais.

Minas Gerais, por exemplo, tem a receber R$ 135 bilhões relativo a essas perdas. Em contrapartida, a dívida atual do Estado com a União é de cerca de R$ 88 bilhões.

A carta destaca ainda que o reconhecimento da necessidade de compensação dessas perdas foi confirmado pela promulgação da Emenda Constitucional 42/2003 e corroborado pelo STF em Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, em 30 de novembro de 2016, estabelecendo o prazo de um ano para regulamentação.

“No intervalo tão extenso desde a promulgação da Lei Kandir, há 21 anos, as perdas dos Estados acumularam-se a valores exorbitantes e vêm prejudicando a capacidade de cumprimento das atividades estaduais. A lei resultou na concentração de recursos da União e, simultaneamente, no enfraquecimento dos Estados, Distrito Federal e municípios, penalizando o cidadão”, diz trecho. “Avaliamos que o encontro de contas pretendido contribuirá para restabelecer a saúde financeira dos Estados e recuperar sua autonomia frente às competências institucionais”, completa o documento.

O governador do Mato Grosso, Pedro Taques, citou a situação de seu Estado frente às perdas com a Lei Kandir.  “O debate é muito importante. Hoje existe uma concentração de recursos nas mãos da União. Desde 1996, com a Lei Kandir, até hoje, o Mato Grosso deixou de arrecadar R$ 61 bilhões. Enquanto isso, a União nos devolveu R$ 7 bilhões. A lei foi importante em um determinado momento para alguns Estados, mas hoje precisamos que essas perdas sejam compensadas, o que não vem sendo feito pela União. Temos perdido muito. O Mato Grosso se faz presente nesta luta com Minas Gerais”, pontuou.

Segurança

Durante a reunião, os governadores também discutiram a necessidade de uma mobilização forte dos Estados em torno da questão da segurança pública das unidades federativas. A avaliação geral dos chefes de executivos estaduais é que o governo federal precisa contribuir de forma mais efetiva nesta questão. Durante o encontro, o governador do Acre, Tião Viana, convidou todos os colegas para se encontrarem, em 27 de outubro, em uma reunião que irá discutir a segurança na região da Amazônia Legal.  O convite recebeu  prontamente o apoio de Fernando Pimentel e demais autoridades.

“Pelas fronteiras do Brasil estão entrando uma quantidade enorme de drogas e armas. Isso impacta a questão da segurança no país como um todo.  Como a guarda das fronteiras compete ao governo federal e não tem sido feita de forma adequada, isso está causando um transtorno enorme no Brasil inteiro e, em especial, para os Estados de fronteira, que não podem substituir o papel constitucional da União e veem crescer a violência sem poder agir. Pode ser um marco importante para tomar decisões efetivas nessa área”, disse Pimentel.

Tião Viana afirmou que a maior emergência do país é a segurança pública. “Hoje, 93% da cocaína do mundo é produzida no Peru e na Bolívia e a porta de entrada é o Brasil. As armas entram juntas e são depositadas, sobretudo, nas grandes cidades. O Brasil estava em 101° lugar, há 26 anos, no consumo de drogas e hoje é segundo – só perde para os Estados Unidos. O país está alheio a isso. A Amazônia é hoje a Colômbia dos anos 80 e o Brasil está alheio a esta realidade”, explicou.

Além dos governadores, também participaram da reunião o presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, Adalclever Lopes, os secretários de Estado de Governo, Odair Cunha, de Planejamento e Gestão, Helvécio Magalhães, de Fazenda, José Afonso Bicalho, o advogado geral do Estado, Onofre Batista, o presidente da Codemig, Marco Antônio Castelo Branco, o Procurador-Geral de Justiça de Minas Gerais, Antônio Sérgio Tonet; além dos deputados estaduais André Quintão, Paulo Guedes, Gustavo Santana, Carlos Henrique, Iran Barbosa, e o prefeito de Diamantina, Juscelino Roque, entre outras autoridades.

Abaixo, a íntegra da carta:

Carta de Diamantina

Reunidos em Diamantina, cidade cuja história lembra a um tempo a riqueza natural, a espoliação tributária e a coragem para promover mudanças, nós, os governadores abaixo assinados, na defesa dos interesses do povo dos Estados que administramos, vimos de público manifestar nossa disposição para o diálogo institucional que permita o encontro de contas entre os Estados e a União, de modo a negociar solução capaz de extinguir tanto as dívidas dos Estados perante a União, bem como as dívidas da União com os Estados, resultado das implicações adversas da Lei Federal nº 87/1996, a Lei Kandir.

Partimos do entendimento de que a própria Lei Kandir, ao isentar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) das exportações de produtos primários e semi elaborados (commodities) e das aquisições destinadas ao ativo imobilizado, estabeleceria recompensas aos Estados pelas perdas inerentes à isenção.

Assim, entendemos por ver na palavra compensação, constante na justificativa do projeto que embasou a referida lei, o reconhecimento da necessidade de reparar um prejuízo. Portanto, percebemos ainda por ver na palavra perdas, constante na mesma justificativa, o reconhecimento de que o prejuízo é resultante da ausência da arrecadação desse tributo estadual. Ressalta-se, por fim, que a própria Lei Kandir já estabelece um critério provisório, válido por cinco anos, para a compensação dessas perdas.

O reconhecimento da necessidade de compensar as perdas sofridas pelos estados foi confirmado com a promulgação da Emenda Constitucional nº 42/2003, que busca o equilíbrio fiscal por meio de transferência constitucional obrigatória da União em favor dos Estados e do Distrito Federal, no entanto, tal medida estaria passível de regulamentação por Lei Complementar.

Este entendimento foi corroborado pelo Supremo Tribunal Federal, em Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, em 30 de novembro de 2016, sobre a necessidade de regulamentação, estabelecendo o prazo de 1 (um) ano.

Ponderamos que, no intervalo tão extenso desde a promulgação da Lei Kandir, há 21 anos, as perdas dos Estados acumularam-se a valores exorbitantes e vêm prejudicando, cada vez mais intensamente, a capacidade do cumprimento das atividades inerentes aos Estados, especialmente Educação, Saúde e Segurança. Destacamos que não apenas os Estados, mas também os municípios são penalizados pela Lei Kandir, uma vez que, 25% dos recursos seriam destinados aos mesmos.

Sentimos que a influência da Lei Kandir sobre o sistema de repartição de receitas resultou na concentração de recursos da União e, simultaneamente, no enfraquecimento dos Estados, Distrito Federal e municípios. Esta consequência desarticula o pacto federativo e penaliza, em última instância, o cidadão.

Acrescentamos ainda que, mesmo com as perdas ocasionadas pela Lei Kandir, os Estados convivem com a obrigação de dívidas perante a União. Assim, enquanto não recebem o que lhes é devido, em razão da Lei Kandir, os Estados transferem uma parcela substantiva de suas arrecadações, desequilibrando ainda mais as finanças estaduais.

Enfatizamos, por fim, que a retração da economia tem resultado na queda significativa das arrecadações estaduais. Somado a não transferência dos recursos da Lei Kandir, os Estados estão em uma situação de verdadeira penúria, tornando frágil a prerrogativa do cumprimento de suas competências constitucionais.

A nossa voz neste dia histórico, voz que traz consigo a da população de nossos Estados é uma voz pelo entendimento, pelo equilíbrio e pela paz institucional. O que desejamos é que nossos Estados e a União possam promover, em clima de solidariedade e de diálogo, o encontro de contas capaz de mensurar as dívidas de todos os entes federados e deduzi-los das dívidas com a União.

Avaliamos que o encontro de contas pretendido contribuirá para restabelecer a saúde financeira dos Estados e recuperar sua autonomia frente às competências constitucionais. Resultará no fortalecimento, agora fragilizado, do federalismo brasileiro, e irá validá-lo como opção pelo reconhecimento da pluralidade do país, pelo equilíbrio de poder e pelo salutar compartilhamento de responsabilidades, direitos e deveres entre os entes federativos.

Assim pensamos, assim desejamos. Essa é a nossa esperança, a nossa confiança e a nossa crença.