Libertação da Paranacre é lembrada com homenagens

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Yawanawás eram proibidos de pintar os corpos, falar a língua e exercer outros costumes tradicionais durante o período de escravidão sob o jugo da Paranacre. (Foto Sergio Vale/ Secom)

Anselmo Forneck, hoje presidente do Ibama, e Shirley Torres, gerente da Secretaria de Esportes e chefe da Comissão Pró-Índio em 1982, foram homenageados durante o Festival Yawanawá em reconhecimento ao esforço contra a exploração e o regime de escravidão imposto pela Paranacre (Companhia Paranaense de Colonização Agropecuária e Industrial do Acre). 

“Eles têm a marca da história do povo Yawa. Em 1992 quando não éramos conhecidos no Acre não tínhamos conhecimento dos nossos direitos montamos uma comissão e fomos pedir ajuda. Junto conosco eles fizeram um enfrentamento aos seringalistas da época e se não fosse a proteção divina não teríamos essa historia pra contar, porque foi o momento mais difícil da nossa trajetória, como outros povos não puderam contar e não estão mais entre nós”, relembra a liderança.

Biraci relembra da coragem que Anselmo, Shirley e Osvaldo tiveram para enfrentar a Paranacre, pedir para que saíssem da terra indígena, expulsar os brancos dos barracões.  “Eles estiveram com a gente nesse momento da nossa história e agora voltam para um momento em que o Estado brasileiro, a Funai, entrega a segunda maior terra indígena do Acre, queríamos comungar com eles este momento da ampliação do nosso território”, justifica o cacique.

Naquele momento, segundo Shirley Torres, a grande revolta era o fato da empresa ter comprado a terra “com os índios dentro”. “Eu era uma garota na época, a única mulher no meio de toda esta história, e sabíamos dos perigos que corríamos, das ameaças de morte que fizeram. Mas ninguém estava ligando, o importante era a libertação daqueles índios”.

 

esq_titulo.jpgLiberdade marca o início do resgate cultural

A Paranacre comprou quase 500 hectares de terra no Estado, na região de Tarauacá, no início dos anos 1970. Os índios já haviam feito contato com o branco e trabalhado para patrões seringalistas, mas nunca tinham sido proibidos de caçar, pescar, exercer seus costumes ou plantar seus roçados. A empresa paranaense era de propriedade do grupo Café Cacique, Viação Garcia e outros donos, todos de Londrina.

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No ritual da caça e da pesca, mulheres aguardam a chegada dos caçadores com fartura de comida. Pajé Yawá acompanha as brincadeiras e rituais para orientar a comunidade segundo os antigos costumes. (Foto Sergio Vale / Secom)

 

Faziam parte da propriedade da Paranacre os seringais Sete Estrelas e Kaxinauwá – antiga moradia do povo Yawanawá, chamada na língua indígena de May Raka “o lugar onde a terra dorme”, terra considerada sagrada também por abrigar os antigos cemitérios. Hoje parte das terras da Paranacre é protegida pela demarcação da Terra Indígena do Rio Gregório e outra parte pertence a um grupo liderado pelo apresentador Carlos Massa, o Ratinho, que doou 40 mil hectares no processo da ampliação do território Yawa. Na antiga demarcação não estavam incluídas as cabeceiras e afluentes dos principais rios e igarapés da região, lugares de caçadas tradicionais às margens do Gregório nem os cemitérios sagrados que guardam os corpos de importes lideranças Yawanawás.

A luta contra a Paranacre iniciou a luta pelo resgate das tradições. Aquele momento marca o despertar do povo Yawanawá. Eles não eram proibidos só de caçar e pescar, mas eram intimidados a falar a língua tradicional, praticar rituais sagrados, beber Uni (ayahuasca), tomar o rapé. “Não éramos vistos como Yawanawás, mas como caboclos, não como um povo que é uma nação que tem uma história. Éramos tratados como pessoas sem identidade, sem lugar, sem referência”, relembra o cacique.

 

esq_titulo.jpgUma nova esperança

 

A aldeia Nova Esperança agrega 70% do povo Yawanawá e foi fundada em 1992 com a retornada de Biraci Yawanawá para a terra indígena. Ele saiu em 1980, junto com Antonio Sales Yawanawá, para estudar e voltou a convite da família para reorganizar o povo e se tornar uma liderança.

“Enquanto eu estive fora da Terra Indígena as coisas mudaram. O povo Yawanawá sempre viveu no antigo seringal Kaxinawá, numa terra que marca a história do nosso povo. Lá foi feito o contato com a sociedade branca, onde meu avô casou, meus pais e tios nasceram, onde nós nascemos e lá tem uma simbologia muito forte do nosso mundo”, explica a liderança Biraci Brasil.

Nova Esperança foi o nome dado pelo cacique para a nova aldeia que seria fundada no rio Gregório, um lugar com o desafio de agregar o povo Yawanawá.

 

esq_titulo.jpgTodos num só lugar

A maior comunidade além da Nova Esperança é a aldeia Mutum, que tem 70 moradores. Além destas há também as aldeias, Tibúrcio, Matrinchã e Sete Estrelas. Os casamentos entre índios de outras etnias provocou uma mistura étnica entre os Yawanawás, que hoje também têm sangue Katukina, Shãwanawa, Rununawa, Shanenawa, Iskunawa e Kaxinawá, todos vindos de outros rios das redondezas das cabeceiras do Gregório.

“Há um desejo de reunir todo o povo num só lugar, incluindo os Yawas que estão espalhados em outros lugares, mas pra isso é preciso ter uma sustentabilidade, uma estrutura interna fortalecida e uma liderança fortemente consolidada. Nosso povo ainda não tem estrutura para isso. Eu acredito na união do nosso povo em torno de um projeto maior que é a valorização dos nossos costumes, a manutenção das nossas tradições”, revela o cacique da Nova Esperança.  

 

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